Em quase 10 anos de carreira, já vi bastante ciclos e modismos. Presenciei o BOOM das empresas de cupons no final de 2010. Era incrível como, na época, 50% dos novos interessados que chegavam a VTEX queriam criar um novo “Grupon” ou um “Peixe Urbano”. Eles acreditavam que poderiam fazer isso dizendo “eu só tenho R$ 5 mil reais!”. Minha preocupação não era o investimento na plataforma, mas se será que eles estavam realmente cientes dos custos envolvidos? Será que o Grupon e o Peixe Urbano tinham sido criados com apenas R$ 5 mil reais?
Outro momento bastante interessante foi o movimento de criação de lojas no Facebook. Enquanto o Facebook não se declarava como um sistema de vendas, a corrida foi imensa para criarem suas lojas: as famosas f-stores ou f-commerce. Empresas foram criadas ao redor do mundo suprir essa demanda. Depois de alguns meses ou poucos anos dessas duas febres, qual foi o resultado? Centenas ou até mesmo milhares de empreendedores brasileiros fecharam suas empresas de cupons e suas lojas virtuais no Facebook. Fornecedores quebraram e o mercado se acalmou.
Agora, alguns anos depois, um novo movimento se assemelha. O mundo e os empresários descobriram o que a Amazon já conhece há mais de 10 anos: O Marketplace!
Milhares de pessoas querem criar seus próprios marketplaces. Quem sabe serem o próximo Mercado Livre no Brasil, o próximo Walmart. Porém, o caminho é bastante árduo. Impossível? Não! Longe disso.
O intuito desse artigo é esclarecer alguns pontos para que você não seja parte da estatística daqui a 4 anos quando um novo ciclo surgir e escrevermos mais um artigo!
Então, tome nota e vamos começar!
Uma das maiores empresas do mundo, a japonesa Rakuten, extremamente competente e qualificada, anunciou, em 2016, mudanças no seu plano dentro do Brasil. Segundo reportagem do portal O Negócio do Varejo, a multinacional optou por parar de investir na vertente marketplace. Sendo assim, será que é tão fácil ou barato montar um marketplace de sucesso?
Vamos aos 4 principais erros do empresário ao querer montar um marketplace:
Seja um tradicional de varejo online ou um marketplace, a loja deve ser reconhecida pelo comprador. Boas taxas de conversão só são alcançadas depois que o cliente tem a certeza da seriedade da loja. Para isso, você deverá investir uma quantia razoável em mídia digital e até offline.
Para as lojas que estão começando, o ROI é de 2 até 4 vezes. Também não espere uma taxa de conversão igual ou superior ao mercado. Provavelmente ela será menor que 1%. Sim! Menor! Todas as lojas, em seu estágio inicial, possuem conversões bem abaixo da média de aproximadamente 1,5% do mercado.
Portanto, se você vai investir R$ 10 mil reais, você deverá faturar algo em entre R$ 20 ou R$ 40 mil reais nos primeiros meses. Esse investimento está longe de conseguir ser sustentável, já que além do volume de visitantes ser baixo, você terá uma baixa conversão.
Você provavelmente deverá investir grandes quantias por um bom tempo (mais de 12 meses) até a conversão aumentar, otimizar a sua mídia e aumentar seu ROI significamente em até 6 ou 8 vezes o valor inicial investido.
Você tem verba para investir durante esse tempo? Você está disposto a essa perda inicial para colher possíveis frutos no futuro?
Na média, um marketplace cobra entre 10% a 15% de comissionamento. Agora, será que essa comissão de fato vai ser suficiente para pagar os custos do seu marketplace? Vamos analisar:
O marketplace geralmente possui 4 principais responsabilidades:
a) Uma vez, conversando com um varejista online de moda que fatura mais de R$ 200 milhões de reais por ano, ele me disse que ele gastava cerca de 18% do seu faturamento em mídia digital! Fazendo uma conta simples, isso significa que a loja tem um ROI de 5.5 o investimento incial. Essa loja investiu mais de 36 milhões para faturar 200 milhões. Mas vamos supor que a sua loja é mais eficiente. Ela terá retorno do investimento inicial de 8x. Sendo assim, você investindo R$ 10 mil reais, faturará R$ 80 mil reais. Esse valor representa 12,5% do seu faturamento.
b) Fazendo uma análise rápida, vemos que sistemas de meio de pagamento como Moip e Bcash cobram em média 5,5% de lojas iniciantes. Mas também vamos dizer que você conseguiu uma taxa excelente de 3,5%! Lembrando que esses sistemas já fazem a análise de fraude. Portanto, o item 2 e 3 da nossa lista já estão contemplados.
c) Agora você foi em uma plataforma de mercado e ela disse que te cobrará 3%! Achou caro? Cuidado, você já viu quanto custa uma plataforma de marketplace? Então de uma olhada no Mercado Livre! Ele gasta mais de 11% do seu faturamento com a plataforma. Difícil acreditar? Hora de somar os custos. 12,5% da mídia, mais 3,5% do meio de pagamento e mais 3% da plataforma, temos o resultado de 19%. Bom. Se você estava pensando em cobrar comissionamentos na média do mercado conforme mostramos, entre 10% e 15%, desista!
Agora se você quiser elevar para 20% o seu comissionamento, tudo bem. No entanto, lembre-se que você ainda tem que pagar diversos custos além dos citados acima. Será que esse 1% que sobra, paga a conta e deixa lucro? E não se esqueça, porque uma loja pagaria 20% para você enquanto pode pagar entre 10% e 15% em outro marketplace.
No mundo virtual, a maior dificuldade dos marketplaces é a curadoria dos conteúdos de produtos enviados por seus lojistas. Muitos marketplaces precisam de uma grande equipe para validar o cadastramento e a foto, e gerar conteúdos diferenciados para que os buscadores indexem corretamente a loja. Esse é o principal trabalho, isso já considerando que os marketplaces recebem informações de lojas que já estão online, logo, o conteúdo deveria ser de qualidade.
Agora, imaginemos um mundo offline. O pequeno lojista muitas vezes não tem sistema interno. Seus controles são manuais. Não há controle de estoque. Não há fotos nem cadastramento rico em informações do produto. Esses pontos tornam a operacionalização do marketplace quase impossível. Mas vamos supor que você consiga lojas físicas que se comprometam em aumentar seus custos para tirar fotos, cadastrar produtos e se dedicar ao marketplace. Será que eles, que não mantêm seus próprios sistemas de estoque atualizados por uma simples cultura, vão manter o sistema do marketplace, que não é seu principal negócio, que realiza poucas vendas, atualizados? Será que você como intermediador não terá muitos problemas pois diversas compras serão realizadas e o lojista não terá o item em estoque para entregar?
Esse talvez seja o maior desafio que vemos no dia a dia. Muitas empresas já desistiram dessa estratégia pois não conseguiram tornar as informações integradas entre o marketplace e o sistema interno do lojista,mesmo quando se disponibiliza um painel, pois o lojista não tem a cultura de atualização de nenhum sistema, ou até mesmo o lojista não conseguiu arcar com o investimento para cadastrar os produtos e tirar fotos.
Uma das atribuições mais complexas do marketplace é o controle financeiro e repasse do valor devido aos lojistas, retendo sua comissão. Note que em marketplaces você deve receber o dinheiro do cliente enquanto o lojista emite a nota fiscal diretamente para o comprador. Depois você deve enviar o dinheiro devido ao lojista, retendo a sua parte de comissionamento, e emitindo uma nota fiscal pela prestação de serviços. Se você achou estranho, não se assuste. É isso mesmo!
Para complicar um pouco, dependendo do contrato que você tiver com o lojista, você pagará a vista ou conforme o parcelamento do cliente. Se você pagar a vista, você terá o custo de adiantamento do dinheiro (e é caro no Brasil né?), custo esse não inserido no nosso problema 2. Se você for pagar parcelado conforme recebimento do cliente, você terá que ter um sistema de conciliação de recebíveis muito bem implementado.
Esse processo, mesmo em pequenos volumes como 10 transações por dia, se torna extremamente complexo. O marketplace deve, além de manter a conciliação de boletos e cartão de crédito em dia, sem falhas, controlar muito bem todas as comissões e transferências a serem feitas.
Por último e talvez mais importante, vale ressaltar que todo marketplace está enquadrado como uma instituição financeira de intermediação de mercadorias. A MP 615 de 2013 dá poderes ao Banco Central (BACEN) à auditar as transações desse tipo de empresa. Portanto, cuidado! Você deverá seguir regras rígidas de como guardar as informações para posteriormente apresentá-las sem correr riscos de multas.
Agora que você já tem o cenário um pouco mais claro, está na hora de começa a trabalhar! Vamos em frente!